por um curto espaço de tempo esta historinha me fez feliz




Perto de onde moro, há um simpático sobradinho que serve de abrigo para idosos, e aqui vai o ponto final da frase.

Mas tudo pode melhorar, então eu lhes digo que o sobradinho é elegantemente pintado na cor rosa antigo, um charme, outro ponto.

Pensam que é só? Não é não. Algum abençoado plantou ao pé do sobrado uma bonita Primavera, que a despeito do outono, ainda está primaverando, em belíssimas flores arroxeadas, ninguém deve ter contado para ela que não é mais estação, então lá está ela, num deslumbre só, e eu gostei tanto desta frase que fico até com pena de colocar outro ponto?

Mas tudo ainda pode melhorar. O construtor do sobrado, para não ter de cortar a linda Primavera, adaptou o telhadinho da sacada, fez um buraco, por onde as flores passam, então elas formam uma magnífica renda roxa por sobre o telhado, garbosas, brilhantes, atrevidas como só primaveras fora de estação conseguem ser. E ponto.

Notaram como as palavras tem o dom de modificar tudo, para mais ou para menos, para mais no nosso caso? Eu poderia simplesmente ter dito que perto de casa há um sobradinho rosa, com um pé de Primaveras na entrada.

Outra história? Há anos meu coração bate por um moço bonito.

Num belíssimo dia, esse moço me mandou rosas. Amarelas.

E não é que junto às rosas veio um cartão? Todo branco.

E nesse bonito cartão veio escrito amo você? Só isso, o moço sabe que não necessito de muita palavração.

Certas palavras são bonitas como primaveras franjadas crescendo nos beirais das casas, não?

Mas agora vou lhes contar um segredo.

Não existe sobradinho nenhum. Primavera nenhuma. Nenhuma flor rendada em nenhuma sacada rosa.

E o moço bonito? ora o moço bonito. Nunca mais tive notícias dele, e se ele ainda estiver por aí, há muito que já se esqueceu de mim, e jamais me mandou flores, ele nunca me mandou nem um olá.

É mais fácil o astronauta americano chegar em Marte do que ele me mandar flores. E mesmo que numa hipótese surreal ele mandasse, não viriam com um cartão de amor, e em papel linho branco!

Então isso tudo me remete a: belas mesmo são as palavras. E flexíveis.

Com elas a gente faz tudo o que a gente quer.

Inventa histórias de primaveras roxas, rendadas, sacadas pintadas de rosa antigo, e de moços que de tão românticos mandam flores amarelas acompanhadas de cartões em papel linho branco.

Bom não? Por um curto espaço de tempo esta historinha me fez feliz.